segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Um amor, uma casa

Uma casa por construir, alicerces em carne, janelas em ferida, portas meias abertas ou meias fechadas... Jardins sem cor, uma fachada cinzenta... E os seus habitantes? Serão almas em cativeiro, serão fantasmas despidos pela mágoa? E as flores do jardim? Serão rosas negras, pintadas pelo tango de um amor proibido, serão giraçóis queimados pelo fogo dos acordes do vento? Será o pó, as cinzas do que outrora foram gargalhadas? Serão as marcas nas paredes, fotografias tiradas á pressa? Serão as manchas no chão, pegadas de um caminho que já não é o meu? E os pratos por lavar, com restos do que já foi em tempos o meu e o teu prato preferido...?
Na cozinha, está a passar um filme, em que eu e tu fomos as personagens principais, em que vestidos pelo suor, provamos que o amor se pode mostrar de qualquer maneira, e se pode condimentar a gosto... Basta querer e desejar. Foi na pedra fria que acendemos a fogueira. Foi lá, que, no meio de suor e saliva, te desejei mais do que nunca. E o filme vai sendo projectado, e agora revejo-o vezes sem conta, quando por lá passo.
Na sala, há quadros de momentos históricos, em que eu e tu, fomos a rainha e o rei...
No quarto, ah no quarto, cada pedaço de parede conta um história. Cada lasca de tinta é um sorriso, um "amo-te". Cada partícula de oxigénio já foi teu e agora é meu. E esta madeira velha, que já provou o peso do nosso amor, está apodrecida. Gasta pelo tempo, que foi passando sem darmos conta.
O tempo torna certos momentos levianos, e as tatuagens - as memórias - tornam-se manchas e deixam de ter significado. Mas o que importam as memórias de todos os dias? As que valem mais são as que ficam connosco para sempre, e que nos veem visitar o coração de tempos em tempos... Como aquela em que pedias para confiar em ti, eu mal te conhecia, mas pedias-me que confiasse porque não me irias largar, e eu agarrei-te com todas as minhas forças... ou então aquela, em que entre lágrimas li o primeiro texto que me escreveste, em que as tuas palavras me deixaram embevecida... Ahhhh como essas memórias estão marcadas no meu corpo... São como o cimento de uma casa...
A casa por construir, sou e tu. Somos nós e o nosso amor. E ficou assim... Congelada no tempo. Á espera de uma nova Primavera...